ALICE

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quinta-feira, 5 de julho de 2018

Carta à minha filha

Alice,
O outro dia contavas-me, com os olhos raiados de lágrimas que uma amiga te tinha pedido para fazer coisas que te deixavam incomodada. Contavas que só desta maneira ela continuaria tua amiga. As coisas que tinhas de fazer deixavam dúvidas em ti sobre a importância dessa amizade, sobre a tua insegurança e influência que ela estava a exercer sobre ti.
Ouvi-te com o meu coração pousado nas minhas mãos, num pulsar acelerado, pela tua voz tremida e os olhos brilhantes e molhados.
Disseste-me: "Mãe, o desafio era fazer um bico a todas as senhoras do ATL ou ir para o meio do campo de futebol mostrar as cuecas!"
E eu fiquei a ouvir-te e a tentar perceber o que sentiste e quais seriam as palavras certas para ti, para que soubesses como reagir na pressão dos outros.
Lembro-me de te dizer da forma mais suave que consegui: "Alice, nunca faças nada que te incomode, que deixe o teu coração triste ou magoado. O que te deixa incomodada não está correto para ti e ninguém te pode obrigar a fazê-lo. Uma amiga não nos deixa tristes ou envergonhados de propósito."
Os teus olhos continuavam trémulos e tristes e os meus procuravam formas de te consolar.
Sabes filha, a pressão dos outros sobre nós é constante, faz parte do viver com os outros. Todos nós já fizemos coisas de que nos envergonhámos, já cometemos erros, já fizemos tolices e deixámos os outros infelizes mas é preciso nunca esquecer quem nós somos e naquilo em que acreditamos ser certo e errado.
Eu tive vontade de ir à escola e falar com a tua amiga, tive vontade de lhe fazer o mesmo mas isso tão depressa passou-me pelo pensamento como desapareceu e quando me pediste para falar com ela eu disse-te: "Vais falar tu com ela. Dizer-lhe que isso te incomoda, te deixa triste e que se ela voltar a fazer és tu que não queres ser amiga dela." 
Seria mais fácil para mim e para ti que fosse eu, na minha altura e força de mãe, assustá-la de tal forma que nunca mais o fizesse a ti ou a outra menina. Mas eu não quero amparar todas as tuas quedas, eu quero que caias e te levantes sozinha. Claro que te darei sempre o meu colo mas na escola, nos teus lugares terás de te safar sozinha, criar as tuas forças e saber distinguir o certo e o errado.
A nossa conversa foi longa, dentro do carro, as duas sozinhas, porque estas conversas surgem do nada, de uma frase que me contas na qual muitas vezes desenvolves partilhando comigo coisas que já aconteceram. E eu desejo que estas nossas conversas nunca desapareçam, que me contes sempre os teus medos e receios e que em mim encontres sempre o apoio que precisas para crescer.
Eu sei, eu sei que mais cedo ou mais tarde terás os teus segredos e eu não fico triste contigo, sei que terás as tuas amigas para partilhar e longe de mim querer ser a amiga de todas as confidências. O que eu quero ser é a tua mãe, que me olhes como aquela pessoa que te amará para sempre e que mesmo triste, desiludida ou chateada contigo nunca deixará de te amar, de te relembrar o que está certo ou errado, como sempre te digo.
Agora que és muito pequena ainda, digo-te que os pais têm de saber de tudo, tudo, tudo. Mais tarde, dir-te-ei que tens direito ao teu espaço de segredos, dentro dos limites da tua segurança física e emocional mas para lá chegaremos porque eu não sei ainda ser mãe de adolescente, só sei ser mãe de crianças pequenas.
Agora, minha linda e doce Alice, meu orgulho de filha, não te esqueças de ti, não cedas a chantagens ou desafios que te envergonhem, que o teu coração te diga que está errado, em troca de amizades de meninas que ainda não perceberam que o que fazem magoa os outros.
Estou muito orgulhosa de ti, orgulhosa porque quando te perguntei se essa menina tinha voltado a fazer-te o mesmo disseste-me muito descontraída que não. "Eu falei com ela!" respondeste. Eu quis saber o que lhe tinhas dito mas respondeste na mesma descontracção: "Já não me lembro!"
A conversa ficou ali, enquanto descíamos a nossa rua e brincavas com o António.
Vou estar sempre por perto, filha. Orientar-te e dar-te o meu melhor para seres resiliente, justa e bondosa. As contas e as letras, sei que te safarás, o resto... o resto é o meu medo, medo de não te orientar da melhor forma, medo de me perder em desafios que não consiga vencer, medo de te perder no mundo.
Alice, apesar dos meus medos, eu vejo em ti uma força, uma empatia com o outro e uma clareza já tão grandes para os teus 6 anos.
Meu amor maior, eu só desejo estar por perto quando fores adulta e testemunhar a beleza do teu coração.
Nunca sejas a vontade de alguém contra a paz do teu coração e mantém-te fiel a ti acima de todas as outras coisas e pessoas.

Amar-te-ei para além deste mundo.

A tua mãe

5 comentários:

Anónimo disse...

Que lindo texto. Também tento todos os dias passar essa mensagem á minha filha que tem mais 3 anos que a Alice.

Beijinhos
Ana

Unknown disse...

Muito bonito! Exatamente o que tento fazer mas com medos também...Ser mãe não é fácil mas é sem dúvida o melhor do mundo.

CS disse...

São ensinamentos para a vida. Nesta altura ainda temos alguma influência sobre elas. Na adolescência será menor...

CS disse...

Só não tem medo quem não tem consciência... É o melhor é o mais difícil. Bj

CS disse...

Há crianças mais fechadas. Podes usar o truque de partilhar coisas tuas do teu dia e esperar que ela com o tempo faça o mesmo. Teras de perceber se há algum momento ou lugar onde ela se sinta mais confortável para o fazer. Bj